Democracia, o deus que falhou(?)

A estrutura desse texto não decorre de uma afirmação e, sim, de um desenvolvimento que expõe alguns pontos, deixando o leitor livre para criar sua própria opinião, devido a palavra democracia possuir uma elasticidade semântica em seu conceito, sendo uma palavra equívoca, com uma pluralidade de significado.

Inicialmente, vale esclarecer que a democracia é amplamente considerada como o melhor sistema político que se pode imaginar. Assim, não poderia ser exagero dizer que a democracia se tornou uma religião secular. Você poderia chamá-la de a maior fé do mundo. Além disso, se for criticar o ideal democrático, existe o risco de ser considerado um inimigo da sociedade civilizada. Portanto, para falar desse tema, vou seguir uma definição etimológica que busca a definição e a tradução literal do termo “democracia”, para, assim, ter uma visão apurada sobre o sistema em questão.

Origens do termo “democracia”:

Para entender a origem do termo, devemos partir da própria história, mais precisamente da Grécia Antiga, onde o conceito surgiu, entre o século V ao VI a.C.. Clístenes, o legislador da cidade, por meio das tensões sociais que existiam em decorrência dos privilégios da aristocracia, os chamados eupátridas, iniciou reformas que implantaram a democracia direta em Atenas. 

Em linhas gerais, o termo foi composto pelos radicais “demos” e “kratos”, que significam, respectivamente “povo” e “governo”, gerando a definição de “governo do povo”, ou “governo popular”.

Assim, a partir da visão de que a democracia é caracterizada como “o governo do povo”, na teoria, um sistema democrático deve ser uma forma de organizar a sociedade onde o povo inteiro participa de todas as decisões públicas — criação de leis; governança dos recursos econômicos, sociais e culturais, entre outros. Porém, o que existe na prática são instituições políticas, que podem ser democráticas ou não, podendo atuar na direção do bem comum ou ao contrário disto.

Por que a democracia?

Essa breve caracterização de alguns pontos do conceito grego de democracia teve o intuito de melhor introduzir o termo para análise do motivo de as pessoas acreditarem nela. 

No Brasil, segundo uma pesquisa do Datafolha, democracia é a melhor forma de governo para 75% dos brasileiros. Vale esclarecer que falsos louvores à democracia podem representar o posicionamento mais convencional ou tradicional a ser feito — optaram pela democracia por acreditarem que um governo democrático lhes dará maior oportunidade de enriquecer, por pensarem que a política democrática poderá abrir uma promissora carreira política, ou porque alguém que admiram disse que a democracia é melhor.

Além disso, na teoria, a democracia se relaciona com práticas que têm como princípios uma série de fundamentos de organização política dentro de uma sociedade, onde prevalecem:

  • a liberdade individual perante os representantes do poder político, em especial em face ao Estado;
  • a liberdade de expressão e opinião de vontade política de cada um;

Democracia: perfeita ou não, eis a questão:

Inicialmente, para este próximo tópico, vou começar com a imagem abaixo:

Manifestante segurando cartaz em defesa da democracia, durante ato no centro do Rio de Janeiro — Foto: Marcos Serra Lima/g1

Será mesmo que a democracia é liberdade? Não vou afirmar nada, mas imagino que quando você deixou de ser criança e passou a ser adulto, você aprendeu um fato básico da vida: o que você gostaria de fazer, muitas vezes, entra em conflito com o que os outros gostariam de fazer. 

Você deve ter aprendido também que o seu grupo segue certas regras que, na qualidade de participante, você também terá de obedecer. Se ninguém pode simplesmente impor as próprias vontades pela força, será preciso encontrar um meio de resolver pacificamente as diferenças, preferivelmente pelo consenso. 

Surge então, uma questão que se mostrou profundamente desconcertante, tanto na teoria quanto na prática: como será possível escolher as regras as quais o grupo será obrigado a obedecer? Devido à excepcional capacidade do Estado de impor suas regras pela coerção, essa é uma questão especialmente importante para a posição de cidadão ou súdito. 

Como pode, ao mesmo tempo, ter a liberdade para escolher as leis que o Estado fará respeitar e, ainda assim, depois de escolher essas leis, ser livre para desobedecê-las?

Outrossim, na obra “Política”, de Aristóteles, o autor discorre sobre os regimes políticos e formas de governo que se perpetuam nas sociedades. Para o filósofo, quando a massa governa, ela pode privar os outros em nome de si. 

Portanto, esse sistema tende a levar à tirania, como qualquer outra governada por poucos setores da sociedade. Dessa forma, os governos devem governar em vista do que é justo e não por interesses de grupos, ou de um indivíduo.

Considerações finais:

Diante de tais angulações, alguns comentários adicionais: é evidente que não é nada simples comentar sobre as singularidades da democracia em curto espaço, porque o assunto requer a compreensão de alguns contextos, sendo impossível dar um salto para o ideal de liberdade da Grécia antiga, com o “povo” tomando decisões.

Assim, dentro do que é possível sintetizar, tem-se apenas um conjunto de legislações criadas pelos próprios legisladores. Consequentemente, tem-se, inevitavelmente, um conjunto de normas que o mais forte impõe sobre o mais fraco. Aliás, sugiro a leitura do texto “Tudo que o Partido reconhece como verdade é a verdade” para melhor entendimento acerca do tema. 

Portanto, apostar num discurso de salvação da pátria, com lastro na figura pessoal de um presidente da República, como muitos imaginam, trata-se de reduzir consideravelmente a riqueza do debate.


*As opiniões do autor não representam a posição do Damas de Ferro enquanto instituição

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