Um breve histórico do feminismo
O feminismo percorreu um longo histórico através dos séculos. Contudo, nesse artigo o foco será no pós guerra, fase mais próxima da realidade que Margaret Thatcher irá presenciar, a começar por um importante livro publicado em 1949: O segundo sexo, de Simone de Beauvoir. Nele, Beauvoir estabelece uma das máximas do feminismo: “não se nasce mulher, se torna mulher”.
Nos primeiros anos da década de 1960 foi lançada a pílula anticoncepcional, primeiro nos Estados Unidos, e logo depois na Alemanha. Esse avanço científico gerou uma virada completa não só no feminismo, mas na vida de qualquer mulher: sem precisarem se preocupar em engravidar, as mulheres passaram a vivenciar a mesma liberdade sexual de um homem, podendo ter relações meramente por prazer. Em meio a toda a efervescência dessa marcante década, Betty Friedan lança em 1963 o livro que seria uma espécie de “bíblia” do novo feminismo: A mística feminina. Durante a década, na Europa e nos Estados Unidos, o movimento feminista surge com toda a força, e as mulheres pela primeira vez falam diretamente sobre a questão das relações de poder entre homens e mulheres. O que há de mais original nessa onda do movimento é a alegação de que existe uma outra forma de dominação – além da famigerada dominação de classe discutida na época –, a dominação do homem sobre a mulher – e que uma não pode ser representada pela outra, já que cada uma tem suas características próprias.
Em 1975, na I Conferência Internacional da Mulher, no México, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou os próximos dez anos como a década da mulher. A Carta Política, lançada pelo Círculo da Mulher em Paris, em 1976, estabelece que: “Ninguém melhor que o oprimido está habilitado a lutar contra a sua opressão. Somente nós mulheres organizadas autonomamente podemos estar na vanguarda dessa luta, levantando nossas reivindicações e problemas específicos. Nosso objetivo ao defender a organização independente das mulheres não é separar, dividir, diferenciar nossas lutas das lutas que conjuntamente homens e mulheres travam pela destruição de todas as relações de dominação da sociedade capitalista”.
É em meio a esses posicionamentos que Margaret Thatcher assumirá seu posto como primeira-ministra do Reino Unido em 1979, cargo que ocupará até 1990.
A implacável dama de ferro e seus princípios inegociáveis
O mandato de Margaret Thatcher como primeira-ministra foi o mais longo do século XX, além de ser a primeira mulher a ocupar o cargo. Sendo uma figura feminina tão importante, o que gerou esse afastamento de Thatcher do movimento feminista como um todo?
Primeiramente, ao contrário de todo o movimento feminista, Thatcher sempre defendeu com unhas e dentes o capitalismo. Em seu discurso ao Partido Comunista em 1988, Thatcher declarou que “Acreditamos que os indivíduos têm um direito à liberdade que nenhum Estado pode tirar. Que o governo é servo do povo, não seu senhor. Que o papel do governo é fortalecer nossa liberdade, não a negar. Que o papel econômico do governo é estabelecer um ambiente em que os empreendimentos possam florescer, e não afastar os empreendimentos do caminho”. Nesse discurso a primeira-ministra faz três importantes defesas: ao indivíduo, ao capitalismo e à limitação do poder do governo.
Contudo, as defesas da dama de ferro não param por aí: ao invés de defender que homens e mulheres deveriam ser vistos de maneira distinta, a dama buscou demonstrar que uma mulher é tão capaz quanto um homem, e há uma importante diferença entre essas declarações. Enquanto o feminismo continuamente dizia que homens e mulheres, ainda que em defesa de um mesmo objetivo, deveriam seguir caminhos separados, Thatcher se aliava a quem tinha os mesmos princípios que ela, independentemente de ser homem ou mulher; para ela, o importante era o indivíduo ali presente. O maior exemplo disso é a sua aliança com Ronald Reagan e o Papa João Paulo II, unidos pelo objetivo de vencer o socialismo soviético.
Thatcher facilmente faria qualquer feminista arrepiar ao saber que a dama de ferro nunca defendeu a saída de mulheres de suas casas para focarem no mercado de trabalho. Pelo contrário, sempre valorizou o papel desempenhado pelas mulheres em seus lares, chegando a comparar suas funções com a da liderança num governo ao dizer que “qualquer mulher que entenda os problemas de cuidar de uma casa está muito perto de entender os de cuidar de um país”. Além disso, apesar de ser bem reconhecida por seus discursos, enalteceu a importância que as ações têm ao provarem o que a pessoa realmente é, gerando sua famosa frase “Ser poderoso é como ser uma dama. Se você tem de dizer às pessoas que você é, você não é”, a qual mostra também sua defesa da feminilidade da mulher, característica por vezes considerada desnecessária pelo feminismo.
A luz conservadora em meio à escuridão progressista
Para além de suas posições veementemente contrárias às do feminismo, o próprio movimento feminista jamais agradaria Thatcher. Isso porque o movimento é definitivamente coletivista, algo que Margaret Thatcher era declaradamente contra, dizendo que “tentar curar a doença britânica com socialismo era como tentar curar leucemia com sanguessugas”.
Essa doença britânica se tratava do pós-guerra. A Grã-Bretanha assumiu uma postura de dependência completa da população perante ao governo, aumentando consideravelmente a dívida nacional enquanto a população, com cada vez menos empregos, pagava impostos altíssimos. Diante desse cenário, Margaret Thatcher assumiu um Estado quebrado, deixando claro desde o início que seu objetivo era “transformar o país, de uma sociedade dependente em uma sociedade autoconfiante, de uma nação dê-para-mim em uma nação faça-você-mesmo”.
Dessa forma, ao mesmo tempo em que prezava pelas tradições britânicas, mantendo o sentimento de nação, defendia um Estado que desenvolvesse poucas funções com muita eficiência. Privatizou a maioria das estatais em sua época, diminuiu a dívida nacional e incentivou o desenvolvimento de empreendedores ao tomar medidas para revigorar o livre-mercado no país. Por vezes deixou claro não acreditar na existência de uma sociedade, mas sim de indivíduos, homens e mulheres, e famílias, evidenciando sua postura anticoletivista e a sua defesa às liberdades individuais.
Acima de todos esses pontos, Thatcher não foi feminista por ser extremamente leal aos seus princípios. A dama de ferro nunca abriu mão do que verdadeiramente acreditava e defendia, realizando ações e medidas completamente condizentes com seus pronunciamentos. Em meio à Guerra Fria e sofrendo pressões externas para adotar uma política de consenso, em 1980 declarou que “Para aqueles que estão à espera daquela famosa frase tão popular na mídia, a virada de opinião, tenho apenas uma coisa a dizer: esta senhora não é de viradas”, demonstrando mais uma vez que uma verdadeira líder não negocia seus princípios, o que a fez alcançar resultados lembrados até os dias atuais.
*As opiniões do autor não representam a posição do Damas de Ferro enquanto instituição.
Referências Bibliográficas:
GARDINER, Nile; THOMPSON, Stephen. LIDERANÇA SEGUNDO MARGARET THATCHER: lições para os empreendedores de hoje. Tradutor: Fernando Silva. São Paulo: LVM, 12 ago. 2022.