O Damas de Ferro é um clube inspirado por trazer conhecimento sobre figuras femininas liberais como Margareth Thatcher e Ayn Rand. Estas mulheres têm um grande histórico tanto para a cultura da liberdade quanto para a política liberal pelo mundo. Entretanto, há uma mulher na história desse nosso Brasil cuja a vida acredito ser muito mais interessante e inspiradora do que esses grandes nomes estrangeiros. Um exemplo feminino de moral, filantropia e empreendedorismo cuja história também envolve amor e intriga, ao nível de novela. Estou falando, é claro, de Eufrásia Teixeira Leite.
A mulher que não quis ser sinhá
Eufrásia nasceu em 1850 em Vassouras. Por parte de pai, ela era filha de um dos maiores capitalistas brasileiros e sobrinha do influente Barão de Vassouras. Por parte de mãe, ela era herdeira de uma das principais e mais ricas fazendas cafeicultoras do Brasil. Quando ambos os pais morreram em 1872, ela e a irmã herdaram um patrimônio de, aproximadamente, 768 contos de réis (o que hoje seria vinte milhões de reais). Na época, essa fortuna era 5% do PIB do Brasil em exportações e metade da verba pessoal de D. Pedro II num ano!
Vimos então que ela era muito rica, uma das mulheres mais ricas do Brasil. Mas a sociedade da época acreditava que essa fortuna toda estava fadada a desaparecer. Afinal, como uma MULHER de 22 anos conseguiria gerir uma fortuna tão grande? Certamente essa sinhá gastaria tudo em frivolidades e traria falência aos negócios da família, certo? O que eles não contavam, porém, era que Eufrásia não era só um rostinho bonito. Ela era também inteligente e hábil com negócios. Após alforriar seus escravos, ela decidiu fazer com toda essa fortuna algo impensável para a época: investir.
Eufrásia investiu a sua fortuna em ações de 297 empresas, de dez países diferentes, além de ter comprado títulos de dívidas de diversos governos. Nem mesmo o ápice da crise de 1929 ou as perdas com empresas confiscadas pela Revolução Russa conseguiram afetar seu patrimônio, que ao fim da vida foi estimado em 1850 kg de ouro (hoje em dia, isso seriam mais de 611 milhões de reais).
Um romance proibido
Outro ponto na história de Eufrásia que chama a atenção é sua história de romance com Joaquim Nabuco. Ambos se conheceram em 1873 num navio para a Europa, e o amor entre eles era tão forte que eles desembarcaram daquele navio já noivos. O interessante nisso é que foi a própria Eufrásia, que era emancipada, a oferecer sua própria mão em casamento, apenas comunicando isso depois aos parentes brasileiros. Apesar de ambos serem de ricas famílias aristocratas, esse noivado teve forte repúdio de seu tio, o Barão de Vassouras. Isso porque o pai de Nabuco era um importante político do partido liberal, enquanto a família de Eufrásia era filiada ao partido conservador. Para piorar, ele e sua família eram abolicionistas, enquanto a família de Eufrásia era latifundiária.
Com o retorno de Nabuco ao Brasil, este noivado proibido teve seus altos e baixos, desfeito e refeito quatro vezes. O romance entre os dois durou quatorze anos (de 1873 a 1887), nos quais ambos se comunicaram à distância por meio de inúmeras cartas de amor. Nabuco acabou por se casar com Evelina Torres Soares Ribeiro, mas Eufrásia jamais se casou. Ela continuou amando-o até o final, e diz a tradição que seu último pedido foi ser enterrada junto das cartas de seu amor Nabuco.
Uma inigualável filantropa
O fim dessa história, porém, não termina com a morte de Eufrásia em 1930. Sua fortuna era tamanha que seu atestado de óbito registrou que ela exercia a profissão de “milionária”, mas ela não se casou nem teve herdeiros. O que aconteceu então com sua fortuna? Ela doou tudo para a caridade!
A maior parte foi para a Santa Casa de Misericórdia de Vassouras, o Instituto Missionárias do Sagrado Coração e o Colégio Salesiano de Santa Rosa de Niterói, mas ela também fez doações menores à Fundação Osvaldo Cruz, a alguns primos e empregados, assim como dinheiro em espécie foi doado aos pobres de Vassouras e aos mendigos que moravam na rua em que ela residiu em Paris.
Em seus terrenos de Vassouras, foram construídos o Instituto Feminino para Moças Pobres, o Colégio Regina Coeli para moças, o Senai e muitos outros prédios. Com os recursos que sobraram, foi construído e mantido o Hospital Eufrásia Teixeira Leite.
O lar de uma grande mulher
Eufrásia foi uma mulher excepcional. Bela, inteligente, empresária e filantropa. Mas sabia que ainda é possível visitá-la? Uma das cláusulas de seu testamento foi de que a sua casa da Chácara da Hera e tudo que nela existisse deveria ser mantido no mesmo estado de conservação, não podendo ser ocupada nem permitir que outros a ocupassem.
O lugar tornou-se um museu, considerado o melhor exemplo de preservação de residências de famílias ricas do fim do século XIX. Como um túnel do tempo, você também pode visitar o lar desta grande mulher e ver como ela viveu: com desafios, conquistas, amor e intrigas. Eufrásia merece ser lembrada como uma das maiores e mais inspiradoras brasileiras de todos os tempos.
