A Era Vargas no Brasil

A Era Vargas (1930-1945) foi um dos períodos mais marcantes e controversos na história do Brasil. E a figura central que dá nome a esse período foi o advogado e político Getúlio Dornelles Vargas (1882-1954). Nesse texto iremos abordar sobre sua trajetória na política, como ditador durante o Estado Novo, e os fatos que o levaram até o suicídio, em 24 de agosto de 1954.

     Nascido em 19 de abril de 1882, vindo de uma família abastada e influente do Rio Grande do Sul, Getúlio Vargas¹ serviu o exército entre seus 16 a 18 anos. Em 1904 ingressou na Faculdade de Direito de Porto Alegre. Durante esse período, Vargas se filiou ao Partido Republicano Riograndense (PRR). A partir daí, deu início a sua carreira política, sendo deputado estadual em 1908 e 1913, depois renunciando e voltando ao cargo em 1917 e sendo reeleito novamente em 1921. Em 1926 foi Ministro da Fazenda durante o mandato de Washington Luís² (1869-1957). No ano seguinte, assumiu o cargo de deputado federal. Em 1928, Getúlio foi eleito presidente de estado (equivalente a governador) do Rio Grande do Sul.

REVOLUÇÃO DE 30

Um dos principais motivos que levou Vargas ao poder deve-se a um rompimento do então Presidente Washington Luís² com os padrões da república oligárquica. Naquela época existia um acordo chamado de Política do Café com Leite³, uma referência a um acordo bilateral entre São Paulo e Minas Gerais, que revezavam a presidência do país durante o período da velha república. As eleições eram realizadas de maneira fraudulenta, e assim as oligarquias se mantiveram por um bom tempo no poder. Esse é um dos principais fatos que caracterizam o segundo período da República Velha⁴ (1894-1930). Contudo no início de 1929¹, ao indicar o paulista Júlio Prestes (1882-1946), ao invés de um mineiro como de praxe, Washington Luís enfureceu os oligarcas mineiros que, alinhando-se aos gaúchos e aos paraibanos, lançaram a candidatura de Vargas para o cargo de Presidente da República do paraibano João Pessoa(1878-1930) ao cargo de vice.

Contudo, Vargas foi derrotado por Prestes, o que acirrou ainda mais os ânimos no país. E a situação ficou ainda pior com o assasinato do vice de Vargas, João Pessoa, em Recife. Após esse fato, Vargas junta mais apoiadores e lidera então um golpe contra São Paulo e Minas Gerais. Como resultado, ao final da década de 30, Washington Luís deixa o cargo devido a diversas pressões políticas e sociais, Prestes é impedido de assumir e Vargas se torna o presidente “provisório” do Brasil, dando fim a República Velha. Esse movimento de Vargas ficou conhecido como Revolução de 30⁵.

Vale ressaltar que a República Velha⁴ já vinha sofrendo com muita instabilidade. Podemos citar o Tenentismo⁶, quando jovens oficiais do exército resolveram se portar contra as oligarquias dominantes na época, realizando revoltas em todo o Brasil, como a Coluna Prestes, a Revolução de 1924, a Comuna de Manaus e a Revolta dos 18 de Copacabana. Esse movimento vai ser importante tanto para o auge como para a queda de Vargas. 

Além do Tenentismo, podemos citar o desenvolvimento de outros estados brasileiros que começaram a buscar maior projeção no cenário nacional, como a Paraíba de João Pessoa. E por fim a crise de 1929⁷. Na época o Brasil era muito dependente da exportação do café, e quando a crise explodiu, a atividade cafeeira foi extremamente afetada, gerando desemprego e dificuldades econômicas que causaram ainda mais instabilidade no cenário político e social durante o mandato de Washington Luís.

GOVERNO PROVISÓRIO (1930-1934)

Como resultado do golpe, com apoio dos tenentes, o governo provisório⁸ de Vargas fechou o congresso e o senado, suspendeu a constituição de 1891 e substituiu os presidentes dos estados por interventores, tenentes nomeados por Vargas, e buscou se aproximar da igreja católica em troca de apoio. Ele também dizia que haveria eleições presidenciais em breve, mas sempre que podia, Getúlio adiava. Isso gerou um mal estar entre alguns dos militares que o apoiaram no ano do golpe.

Quem estava realmente descontente eram os oligarquistas, que em 1932 após Vargas mostrar sinais de que preferia governar sozinho, travaram em São Paulo uma luta armada contra as forças de Vargas⁸, sendo então sufocados por elas. No ano seguinte, foi instaurada uma Assembléia Nacional Constituinte, elaborando uma nova Carta Magna que oficialmente tornaria Vargas o Presidente da República e estabeleceria novas definições como o voto secreto e o mandato de quatro anos. Em 1934 se tem o fim do governo provisório e o início de um novo capítulo para Getúlio, o Governo Constitucional.

GOVERNO CONSTIUCIONAL (1934-1937)

Com o fim do governo provisório e a promulgação da constituição de 1934⁹, Vargas é eleito de forma indireta pela Assembléia Nacional Constituinte como Presidente da República. Mas a nova constituição não trouxe a paz que Vargas queria. Pelo contrário, esse período é marcado principalmente por revoltas, sendo que uma das principais delas ocorreu em 1935, conhecida como Intentona Comunista⁹. 

Partidos e movimentos de esquerda entraram em confronto com as forças de Vargas, o que permitiu que Vargas conseguisse mais poder e influência para reprimir esses ataques. Posteriormente, se sentindo ameaçado por um possível golpe comunista, instaura um estado de sítio, suprime os direitos individuais e persegue opositores. Em 1937, Getúlio oficializa seu projeto de autogolpe, instaurando o Estado Novo.

ESTADO NOVO (1937-1945)

O Estado Novo¹⁰ acontece durante um período de radicalização da política no mundo. Estamos falando de um período pré-guerra, com diversas ditaduras de extrema-esquerda e extrema-direita pelo mundo, como o stalinismo, o facismo e o nazismo. Vargas queria uma ditadura para chamar de sua, e em novembro de 1937 conseguiu. Fechou o congresso, promulgou uma constituição ainda mais autoritária e assim conseguiu permanecer no poder por mais alguns anos. 

Assim como em outros governos autoritários, o poder executivo federal foi fortalecido, bem como os interventores de Vargas. Baniu partidos. Aumentou a perseguição, a censura e o propagandismo político, bem como um extremo culto a personalidade de Vargas. Comprava a opinião de artistas e intelectuais e assim conseguia controlar a opinião pública (certos hábitos nunca mudam). Também foi responsável por uma política nacionalista protecionista bastante marcante, leis trabalhistas, projetos voltados para a cultura, entre outras ações.

Contudo, com o fim da segunda guerra mundial em 1945, Vargas perde parte da sua elite intelectual e se encontra com a imagem desgastada, enquanto sofre pressões dos mineiros por novas eleições democráticas. No final do seu mandato, Vargas tenta se aproximar mais da classe de massa, promulgando a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT). Mesmo assim, em outubro de 1945, os militares que ajudaram Vargas a assumir o poder, após voltarem da Europa e verem os horrores que as ditaduras causam no mundo, cercaram o palácio presidencial e forçaram Getúlio a renunciar, dando fim ao Estado Novo.

SEGUNDO GOVERNO (1951-1954)

No segundo governo de Vargas¹¹ ele foi eleito de forma incrivelmente democrática. Ele continuou ativo na política após deixar de ser o Presidente da República em 1945, e em 1950 planejou sua volta ao cargo. Se aliou a pessoas influentes como o político Ademar de Barros, um populista bastante forte em São Paulo. Com a redemocratização no Brasil em 1946, os partidos voltaram, e Vargas realizou alianças com o Partido Social Democrático (PSD), União Democrática Nacional (UDN), forte opositor de Vargas, e foi candidato pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Vargas era um bom orador, dizia o que as massas queriam ouvir, e o resultado não poderia ser diferente, com Vargas se reelegendo ao cargo de presidente da república.

No entanto, apesar de uma eleição relativamente tranquila, esse segundo governo foi marcado por mais crises e uma oposição forte da UDN. Havia uma disputa entre liberais e protecionistas, o que causou uma divisão de opiniões entre aqueles que queriam abrir o mercado, e aqueles que viam o investimento estrangeiro como uma ameaça. Essa ruptura chegou até o exército, com militares pró e contra a ideologia de Vargas de estatizar as atividades econômicas do Brasil e restringir investimento estrangeiro. 

Para tentar contornar essa situação, ele buscava garantir seu apoio com o PSD e o PTB. No entanto, o efeito foi contrário. Vargas se queima com os partidos, o que fortalece ainda mais a oposição da UDN contra ele. Some isso a falta de apoio da elite brasileira, acusações de corrupção, a crise econômica e a aproximação de Vargas com ideais comunistas. Um clima de caos foi instaurado. Getúlio começa a perder apoio entre a classe operária, e acaba indicando João Goulart para o cargo de Ministro do Trabalho, que mais tarde foi demitido por causar insatisfação entre a imprensa, a UDN e os militares.

As coisas escalam ainda mais em 1954, quando uma tentativa de impeachment foi barrada no congresso, e uma carta aberta escrita por oficiais do exército demonstrando seu descontentamento com o governo em uma possível tentativa de golpe. Contudo, em 5 de agosto de 1954 ocorreu uma tentativa de assassinato a Carlos Lacerda, opositor de Vargas, que ficou levemente ferido, mas o seu segurança um major da aeronáutica foi vitimado. Com indícios do envolvimento do chefe de segurança do palácio presidencial, Gregório Fortunato, a mídia e a oposição começam a apertar o cerco ainda mais em volta de Vargas, que daria um ponto final nisso em breve. No dia 24 de agosto de 1954, Getúlio atira no próprio coração, cometendo suicídio, e dando fim então a uma das personalidades mais controversas da história do Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Getúlio Vargas perseguiu opositores, assassinou pessoas, restringiu liberdades. Por outro lado, ajudou a desenvolver a industrialização no Brasil, consolidou leis trabalhistas, entre outros projetos. Muitas pessoas o enxergam como um grande estadista, que trabalhou em prol do desenvolvimento nacional, através do seu olhar protecionista. Outros afirmam que sim, Getúlio foi um ditador, e de fato ele foi. O Estado Novo foi um exemplo disso. Talvez o que tenha ajudado a marcar o legado de Vargas além dos seus projetos, por ter sido o presidente a ficar mais tempo no poder na história do Brasil, foi também o seu final trágico, repleto de escândalos e, que mesmo assim, quando a morte de Vargas foi noticiada, a comoção nacional foi tamanha que até Carlos Lacerda, da oposição, teve de se exilar do país, pois estava sendo perseguido¹¹.

Essas personalidades ambíguas são interessantes pois, como Harari menciona no seu livro Sapiens¹², não existe uma luta entre o bem e o mal na história da humanidade, existem pessoas egoístas que farão o necessário para atender suas necessidades. Getúlio era egoista, queria todo poder para si, e conseguiu, mas no final das contas tirou a própria vida por conta das decisões tomadas ao longo da sua carreira. 

Vargas foi um homem do seu tempo, e será para sempre uma figura bastante emblemática na história do Brasil.

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