Os maiores genocidas da história

Embora, atualmente, muito se fale sobre genocídio, a realidade é que a maioria dos comentários mostra-se limitada e muito distante da realidade. Contrariando a lógica, pessoas bem informadas, muitos intelectuais e alguns partidos políticos simpatizam com o socialismo e com o maoísmo. O texto a seguir não é um texto fácil de ser lido – e escrito – uma vez que nos leva aos cumes mais obscuros e sanguinolentos da história da natureza humana. Ainda sim, conhecer a história nos dá a oportunidade de olharmos para o passado sob um viés crítico, a fim de nos esforçarmos para evitar que as perversas sombras da maldade e da selvageria assolem a nossa existência mais uma vez. 

O que é genocídio?

Antes de 1944, o termo genocídio não existia. O caro leitor deve lembrar-se bem do que ocorria nesse período; os olhos do mundo estavam voltados ao Grande Reich Germânico. O termo, portanto, foi desenvolvido como um conceito específico para designar crimes que têm como objetivo a exterminação da existência de grupos nacionais, étnicos, raciais e/ou religiosos. Em 1944, um advogado judeu polonês chamado Raphael Lemkin (1900-1959) tentou descrever o que era a política de assasinatos sistemáticos nazista. Para tanto, ele criou a palavra “genocídio”, a partir de um neologismo que incluia a palavra grega geno – que significa raça ou tribo – como prefixo, e a palavra latina cídio – que significa matar- como sufixo. A partir disso, Lemkin define “genocídio”:

 “Um plano coordenado com ações de vários tipos, que objetiva a destruição dos alicerces fundamentais da vida de grupos nacionais com objetivo de aniquilá-los.”

Em 1945, o Tribunal Militar Internacional, que fora instituído em Nuremburg, acusou os líderes nazistas de terem cometido “crimes contra a humanidade”. Nesse contexto, a palavra recém criada por Lemkin estava incluída no processo, mesmo que apenas de forma descritiva, sem qualquer cunho jurídico. Alguns anos depois, em 1948, as Nações Unidas aprovaram a Convenção para a Prevenção e Punição de Crimes de Genocídio. Esta Convenção estabeleceu o “genocídio” como crime de caráter internacional, e as nações signatárias da mesma comprometeram-se a “efetivar ações para evitá-lo e puní-lo.

Sob essa ótica, a definição de genocído ganhou robustez. Por genocídio entende-se quaisquer dos atos abaixo relacionados, cometidos com a intenção de destruir, total ou parcialmente, um grupo nacional, étnico, racial, ou religioso, tais como:

  • Assassinato de membros do grupo;
  • Causar danos à integridade física ou mental de membros do grupo;
  • Impor deliberadamente ao grupo condições de vida que possam causar sua destruição física total ou parcial;
  • Impor medidas que impeçam a reprodução física dos membros do grupo;
  • Transferir, à força, crianças de um grupo para outro.

Representantes dos países que ratificaram a Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio no dia 14 de outubro de 1950. 

Adolf Hitler

Ascensão ao poder 

Não poderíamos iniciar o assunto sem mencionar o nome mais atribuído ao termo Genocídio, Adolf Hitler. Como fora supracitado, o termo ganhou significado a partir das barbaridades cometidas durante o regime nazista. O Chanceler do Reich (1933 -1945) conhecido como o principal instigador da Segunda Guerra Mundial na Europa e a personalidade central do Holocausto é o ditador que “ninguém quer chamar de seu”. 

No início dos anos 1930, a Alemanha enfrentava um clima sombrio. A humilhante derrota da Primeira Guerra Mundial estava fresca na memória da população, que agora vivia a depressão econômica, com índices altíssimos de desemprego. Nesse sentido, os Alemães já não confiavam no seu franzino governo, a República de Weimar. Esse ambiente de descrença, humilhação e sede de vingança proporcionou o surgimento de um novo líder, Adolf Hitler e o seu partido, o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDA) ou o Partido Nazista (NAZI).

A realidade é que este líder tem uma trajetória um tanto contraditória: Em 1923, ele organizou um golpe de Estado em Munique para. A tentativa de golpe fracassou e ele foi preso. Nesse período, Hitler escreveu o seu manifesto político e autobiografia, Mein Kampf. Logo em seguida, em 1924, ele começa a ganhar apoio da popular na Alemanha com demonstração da sua forte oposição ao Tratado de Versalhes, a partir de concepções de pangermanismo, antissemitismo e anticomunismo. Nesse momento, Hitler já fazia uso intenso da propaganda. Inclusive, este tecia severas críticas em relação ao sistema capitalista e ao comunista. Ironicamente, em 1933, o Parlamento aprovou a Lei Habitante de 1933, que inicou um processo de transformação da República de Weimar na Alemanha Nazista, que ansiava por uma ditadura de partido único totalitária, autocrática e de ideologia nacionalista socialista. Nesse contexto, o Partido Nazista já era o maior partido eleito e Adolf Hitler já havia sido apontado com Chanceler da Alemanha.

Holocausto

Por definição, o holocausto foi a perseguição sistemática e o assasinato de cerca de 6 milhões de judeus (dados do United States Holocaust Memorial Museum). 6 milhões de pessoas, 6 milhões de vidas, 6 milhões de histórias, 6 milhões de corações pararam de bater no período entre os anos 1941 a 1945.

Quando chegaram ao poder, os nazistas, de imediato, não começaram os assassinatos em massa; eles utilizaram o Estado para atacar e excluir judeus da sociedade alemã. Se você colocar um sapo em um recipiente com água fervendo, ele pulará para escapar. Se você, no entanto, colocá-lo sob temperatura amena e aquecer, gradativamente, a água, ele ficará lá até morrer. Foi isso que o regime nazista fez. De maneira gradativa, o ódio aos judeus foi incentivado, entre outros aspectos que explicam a questão antissemita, muito bem explicado pela Hannah Arendt, em As Origens do Totalitarismo

A radicalização do antissemitismo culminou na elaboração de um plano, o qual os líderes nazistas referiam-se como: “Solução Final da Questão Judaica” . Endlösung der Judenfrage, a solução final, foi o assassinato deliberado e sistemático, em massa, dos judeus europeus,  a última etapa do Holocausto levada a cabo de 1941 a 1945. Embora muitos judeus tenham sido mortos antes do início da “Solução Final”, a grande maioria das vítimas foi assassinada durante este período. A Alemanha nazista cometeu assassinatos em massa numa escala sem precedentes usando dois métodos principais:

  1. Fuzilamento em massa: as unidades militares e militarizadas alemãs efetuaram fuzilamentos em massa nos arredores de aldeias, cidades e capitais na Europa Oriental.; 
  2. Asfixia das vítimas: as operações de gaseamento foram conduzidas em campos de extermínio e em caminhões que matavam por intermédio de um gás asfixiante. 

Retrato de Dawid Samoszul em Piotrkow Trybunalski, na Polônia, entre os anos de 1936 e 1939. Dawid foi assassinado no campo  de Treblinka aos nove anos de idade. 

Cidadãos poloneses enforcados pelos nazistas em Sosnowiec. Polônia, durante a guerra.

Cigano vítima das experiências médicas nazistas para transformar água marinha em água potável. Campo de concentração de Dachau, Alemanha, 1944.

Corpos empilhados atrás do crematório em Buchenwald. Alemanha, maio de 1945.

Josef Stalin 

O protagonista do terror descrito a seguir foi um revolucionário comunista e político soviético de origem georgiana que governou a União Soviética (URSS) na década de 1920 até sua morte, servindo como Secretário Geral do Partido Comunista de 1922 a 1952, e como primeiro-ministro de seu país de 1941 a 1953. Inicialmente, Stalin presidiu um Estado unipartidário, que era governado por um sistema de liderança coletiva. Posteriormente, na década de 1930, ele consolidou o poder tornando-se o ditador ou autocrata da União Soviética. O líder era ideologicamente ligado à interpretação leninista do marxismo, inclusive ajudou a formalizar tais ideias como marxismo-leninismo. No fim, suas próprias políticas ficaram conhecidas como stalinismo.

Holodomor ou fome vermelha

Nesse momento, o número de mortes aumenta vertiginosamente e a história é ainda mais impiedosa. O regime nazista marcou com sangue a história dos judeus (e de outros grupos), assim como o regime socialista fez com a história dos ucranianos. A diferença, no entanto, é que o Holocausto foi reconhecido mundialmente como genocídio, mas o Holodomor, não. A desgraça dos milhões de ucranianos que morreram de fome, enquanto a Ucrânia era considerada o manancial da Europa, segue sendo, acintosamente, ignorada por muitos países. Atualmente, além da Ucrânia, cerca de 15 países — entre os quais Estados Unidos, Portugal, Canadá, e Argentina, Colômbia, Paraguai, Peru, Equador e México— consideram o Holodomor um genocídio. O Brasil não faz parte desse grupo. O Holodomor, ou Fome-Terror, ou mesmo Grande Fome Vermelha, foi uma crise generalizada de fome que atingiu a Ucrânia durante o regime comunista soviético liderado desde 1922 por Josef Stalin (1878-1953). O termo é oriundo das palavras em ucraniano “holod” (fome) e “mor” (praga ou morte). 

A histórica resistência ucraniana  

Em 1918, Vladimir Ilitch Lênin esforçou-se para impor um governo soviético sobre a população da Ucrânia, que havia declarado sua independência poucos meses antes. Num primeiro momento, parecia que Lênin havia obtido êxito. Inclusive, há relatos da existência de uma política secreta anterior à KGB, a Cheka, que foi responsável por assassinar pessoas que ousaram utilizar a língua ucraniana nas ruas. No final desse mesmo ano, o povo ucraniano já havia restabelecido a sua república, felicidade que duraria pouco, diga-se de passagem. Além da vontade de possuir controle sobre o país, o interesse soviético em incorporar a Ucrânia era claro: aspiração pelos seus recursos naturais. Como já mencionado, a Ucrânia gozava do título de Manancial da Europa, em virtude do seu solo extremamente fértil e produtivo. Em resumo, em 1928 a Ucrânia estava sobre às garras do sistema soviético. 

Fazendas coletivas e deskulakização

Durante a Guerra Civil Russa, em 1919, Lênin havia aplicado uma política de confisco em escala maciça de cereais dos camponeses chamados de sabotadores, para tentar vencer a fome que já havia se instaurado. Naturalmente, os camponeses começaram a produzir menos, uma vez que tinham ciência de que o fruto do seu trabalho poderia ser tomado a qualquer momento. De qualquer forma, esta parecia ser uma situação atípica, em virtude do contexto de guerra. Infelizmente, o confisco de cereais não parou por aí.

Tendo em vista que a abolição da propriedade privada da terra é um programa importante, sob a ótica marxista, não demorou muito para que o Estado criasse esforços para tanto. Na década de 1930, Stalin decide aplicar uma nova política na URSS, e a coletivização da agricultura seria um dos seus pilares. Em outras palavras, tudo o que pertencia aos camponeses – o gado, as terras, as colheitas – pertenceria ao Estado. Para tanto, o Estado soviético precisava eliminar a camada mais produtiva e favorável à economia de mercado – os Kulaks. Mais tarde, esse processo ficou conhecido pelo termo Deskulakização. A maioria dos ucranianos rurais, que eram agricultores independentes de pequena, escala ou de subsistência, resistiu à coletivização. Eles foram forçados a entregar suas terras, gado e ferramentas agrícolas, e trabalhar em fazendas coletivas do governo (“kolhosps”).

Sem dúvidas, não foram somente os Kulaks que ficaram infelizes com a nova política; muitos camponeses alegavam que estavam trabalhando como escravos nas fazendas coletivas.  Nesse sentido, o ditador falava, sem escrúpulos, sobre a sua política de “liquidação da classe dos Kulaks”, e com o passar do tempo, como já era esperado, a definição do que constituía um kulak tornou-se extremamente ampla. Em determinado momento, o termo – e as  penalidades atrozes sofridas a quem o termo fosse designado – podia ser aplicado à maioria dos camponeses. 

Aconteceram dezenas de protestos, que foram brutalmente reprimidos pela polícia secreta soviética (GPU) e o Exército Vermelho. Dezenas de milhares de agricultores foram presos por participar de atividades antissoviéticas, fuzilados ou deportados para campos de trabalho forçado.

A fome 

Em concomitância com a coletivização forçada, Stalin, em 1929 recriou a campanha contra a cultura nacional ucraniana, levando em consideração que o sentimento naciolista ucraniano representava uma ameaça iminente ao regime. Neste ano, o líder autoritário decidiu, de uma vez por todas, acabar com aquilo que havia apelidado de “lealdade dividida da Ucrânia”. Num primeiro momento, essa política teve direcionamento aos intelectuais do país, que foram cassados e presos. Depois, Stalin passou a afrontar o campesinato. 

A partir desse momento, Josef tem como objetivo aterrorizar os camponeses comuns – física e espiritualmente-, uma vez que qualquer personalidade que pudesse ser classificada como Kulak já havia sido cassada, expulsa ou assassinada. Para tanto, ele estipulou metas de produção de entrega de cereais, as quais só seriam cumpridas se os próprios ucranianos parassem de se alimentar. Foi o que aconteceu. O não cumprimento dessas exigências estipuladas era considerado sabotagem, mas como a produção era baixa, os camponeses frequentemente ficavam sem nada após o recolhimento dos cereais. O resultado dessa política era previsível: as pessoas começaram a morrer de fome, de inanição. Um camponês que não possuísse aspecto cadavérico, a aparência de alguém esfomeado, era, imediatamente, considerado suspeito pelas autoridades soviéticas.

Memorial às vítimas do Holodomor, em Kiev, na Ucrânia

Testemunho de um ativista citado por Robert Conquest:

Eu ouvi as crianças… engasgando sufocadas, tossindo e gritando de dor e de fome.  Era doloroso ver e ouvir tudo aquilo.  E ainda pior era participar de tudo aquilo…. Mas eu consegui me persuadir, me convencer e explicar a mim mesmo que aquilo era necessário.  Eu não poderia ceder; não poderia me entregar a uma compaixão debilitante …. Estávamos efetuando nosso dever revolucionário.  Estávamos obtendo cereais para a nossa pátria socialista….Nosso objetivo maior era o triunfo universal do comunismo, e, em prol desse objetivo, tudo era permissível — mentir, enganar, roubar, destruir centenas de milhares e até mesmo milhões de pessoas…

Relatos de canibalismo

Segundo Natalia Ivanonva, colega de classe e amiga mais próxima da garota envolvida no evento, Tkachenko Lydia Vasylivna

Um dia, na escola, Lydia disse às amigas que ontem, quando voltou para casa depois da escola, não encontrou seu irmão mais novo, Shura. A mãe de Tkachenko, Fenya Trokhimivna, disse a ela que seu irmão havia morrido. No entanto, a casa tem caldeirões cheios de carne cozida. Lydia não comeu, mas contou suas suspeitas para os vizinhos do outro lado da rua: Burlaks. Depois de um tempo, a mãe matou seu segundo filho, Vitya.

Do caso de investigação nº 137 da cidade de Berezovo:

Durante o interrogatório de Hylinychiv Andriy e Varvara, foi estabelecido que em 27 de junho, aproximadamente às 19h00, Varina Gilinych, com o consentimento e na presença de seu marido Andriy Gilinych, esfaqueou sua filha Anna, de um ano, que era sentada em um banco, e corte-o em pedaços. A carne foi cozida e comida. Naquela mesma noite, quando seu filho de 4 anos, Petro, foi para a cama e adormeceu, Gvarinich Varvara, com a ajuda do marido de Gilynich, Andriy, estrangulou seu filho adormecido com as mãos e também a cortou em pedaços, que ela cozinhou e comeu.

Relatos como esses são facilmente encontrados na internet. Nesse sentido, não há concordância em relação aos números de mortos durante o Holodomor; as fontes variam de cerca de 3,5 milhões para 17 milhões. Infelizmente, o horror da fome vermelha sofrida pelos ucranianos continua sendo ignorado e posto debaixo dos panos, para que o sonho do mundo perfeito dos teletubbies socialistas não seja destroçado. É possível que, ao final do texto, o leitor esteja se perguntando sobre a relevância de conhecer tais genocídios, o Holocausto judeu e o Holodomor, de maneira tão íntima. Como supracitado, conhecer a história nos dá a oportunidade de perceber a repetição de determinados padrões. A selvageria, a truculência e a desumanidade só ganham espaço na rodinha quando a Liberdade vai dar uma volta.

“Se fosse assim tão simples! Que em certo lugar houvesse umas pessoas obscuras, perfidamente tomando atos obscuros, então bastaria distingui-las das demais e destruí-las. Mas a linha que divide o bem e o mal atravessa o coração de cada ser humano. E quem pode destruir um pedaço do próprio coração?… Ao longo da vida de um coração, essa linha muda de lugar dentro dele, ora comprimida por um mal radiante, ora abrindo espaço para um bem que vai alvorecendo. O mesmíssimo ser humano, em diferentes idades, em diferentes situações da vida, é uma pessoa totalmente diferente. Ora próxima do diabo, ora próxima de um santo. Mas o nome não muda, e a ele nós atribuímos tudo. Sócrates nos alegou: conhece-te a ti mesmo. E, diante da cova para dentro da qual já nos preparávamos para empurrar nossos ofensores, nós paramos, perplexos: afinal, só calhou de não sermos nós os carrascos, mas eles.”

Arquipélago Gulag, Aleksandr Soljenítsyn.

Jade Peres

Referências

https://www.ushmm.org/

Arquipélago Gulag – Aleksander Soljenítsyn

The Harvest of sorrow – Robert Conquest

The Great Terror: A Reassement

A fome vermelha: a guerra de Stalin na Ucrânia – Anne Applebaum

1 comentário em “Os maiores genocidas da história”

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