Destruir o Passado Inviabiliza o Futuro

Destruir o Passado Inviabiliza o Futuro

A real dimensão do título desse texto, apesar de compreensível, precisa ser devidamente apresentada ao leitor: acontece que, se você derrubar os pilares de uma construção, acabará por derrubá-la por completo, ainda que esta não seja a sua intenção. Isto porque as consequências estão diretamente ligadas às ações e independem das intenções.

Dito isso, vamos ao assunto que me traz até aqui: uma boa parte da sociedade acredita que precisamos destruir tudo e começar do zero uma estrutura completamente nova, mas – felizmente – nem todos concordam com este ponto de vista. Além disso, é preciso considerar as consequências desta linha de pensamento.

Muita gente compreende que só chegamos até aqui em razão dos nossos valores, os pilares de tudo o que construímos. Ainda que a “turminha da demolição” não queira admitir, até mesmo o espaço que estão tendo também é consequência direta destes valores que eles agora querem transformar em pó. Não me entendam mal, eu não me importo com pensamento dissidente, eu valorizo a liberdade do indivíduo de expressar seus pontos de vista, exatamente por isso não quero que tudo isso seja derrubado.

Esse plano revela o fatalismo e o desespero daqueles que parecem ainda não ter compreendido que o mundo está em constante mudança e movimento. Não é preciso uma obra tão grande, basta que usemos, com sabedoria, a ordem natural das coisas de continuar em constante transformação, guiando-a por caminhos que nos levem a uma real prosperidade.

Por isso a analogia dos pilares, porque é realmente como uma casa, não precisamos construir tudo de novo justamente por entender que sempre será necessário um conserto, uma reforma ou uma obra de expansão e que nós vamos mudar os móveis de lugar e trocar a decoração de tempos em tempos.

Perdoem a minha sinceridade, mas a maioria das pessoas que rechaçam os valores e não acreditam em verdades absolutas são as mesmas que reclamam quando alguém discorda de seus pontos de vista usando os argumentos nos quais eles dizem acreditar: se não existem verdades absolutas, como vocês têm tanta certeza que estão certos?

Na realidade, a maioria das pessoas não sabem lidar com as consequências de suas próprias crenças, eis um exemplo: as relações líquidas das quais fala Bauman são excelentes, até que você tenha alguém em sua vida que realmente viva de acordo com esses preceitos. É neste momento que a você, que tanto gostou do leu, passa a entender as consequências práticas desta teoria, revelando que jamais alcançou a crença por meio de uma reflexão racional e crítica.

Estou tomando imenso cuidado para não generalizar pois sou a primeira a dizer que o “sempre”, o “nunca”, o “ninguém” e o “todos” geralmente nos levam a erros terríveis. Mas é preciso questionar se realmente são os “paladinos da destruição” quem devem estar à frente do nosso projeto de futuro, especialmente levando em consideração as evidentes lacunas em seus próprios argumentos.

Permita-me um breve parêntese para declarar, de forma inequívoca, que eu não sou tradicionalista, acredito firmemente que nós chegamos até aqui acertando, errando, concordando, discordando, mas, principalmente, mudando. Nada é estático, e isso deveria ser uma dessas verdades auto evidentes, mas existem pilares sem os quais nada disso seria possível, princípios importantíssimos que nos guiaram por todo o caminho e devem ser mantidos se quisermos continuar nesta estrada.

Não é sobre não mudar, não corrigir o curso ou não entender que algumas coisas estavam erradas ou precisam melhorar, é sobre não fazer disso uma justificativa para a ideia mais absurda de todas: jogar fora o mapa e o GPS durante uma longa viagem de carro por uma estrada desconhecida.

Os verdadeiros valores – aqueles que realmente sustentam tudo o que construímos até aqui – são atemporais, mesmo quando a maioria tenta negar esta realidade. Mentir era errado há séculos e isso não mudou, não é porque alguns decidem fazer da mitomania o seu modus operandi que eu vou deixar de acreditar na verdade e na honestidade.

Mais do que nunca, é preciso gritar aos quatro ventos a importância da razão e do senso crítico. Os questionadores – por vezes taxados de chatos e incômodos – são necessários para causar uma parada estratégica, ou pelo menos uma redução de velocidade que nos força a refletir e a considerar as consequências de nossas ações, crenças e opiniões.

Construa algo novo, pense diferente, abra caminho por lugares onde ninguém ousou passar, mas não se contente em ser um reles destruidor de legados como se isso fosse te levar a algum outro lugar senão as ruínas da sua própria demolição. Derrubar o passado não constrói o futuro, mas apaga a história, os valores e todas as valiosas lições que aprendemos até aqui.


Suellen Marjorry

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