Quais os princípios de defesa da vida

Este é um texto resposta ao “Maternidade Cancelada”, outro texto publicado no Damas de Ferro cujo tema era a legalização do aborto. O texto traz bons dados e informações para argumentar porque conservadores deveriam ser pró-aborto, mas prega para convertidos quando se recusou a abordar o principal argumento pró-vida: acreditar que o feto já é uma vida humana. Entender este argumento é essencial não apenas para entender a posição pró vida como também a grande discussão social que fez o tema ressurgir.

Um consenso pragmático

Acho importante começar dizendo que ser pró-vida não significa necessariamente ser conservador ou religioso. Há quem acredite, por exemplo, que, sendo o embrião uma vida, é um cidadão, portanto, é dever do Estado protegê-lo. O tema não é consenso nem entre libertários, havendo quem acredite que o Princípio de Não Agressão e os direitos naturais também são válidos para o feto. Ser pró-vida não envolve ideologia, apenas acreditar que o feto é uma vida, e foi o respeito a essa posição legítima que permitiu a legalização do aborto avançar tanto no mundo.

Na Europa, por exemplo, o aborto é legalizado em quase todos os países e conta com o apoio de grandes figuras do conservadorismo europeu como Margareth Thatcher e Boris Johnson. Entretanto, a maioria dessas legalizações considera o argumento pró-vida e restringem-se apenas ao primeiro trimestre da gestação, pois é quando surge o sistema nervoso central, um dos cinco consensos para o início da vida humana (confira os outros quatro neste artigo). Na Itália, inclusive, a legalização permite ao médico se negar a realizar o aborto caso não concorde com a prática.

O avanço progressista

Esse consenso também foi conquistado nos Estados Unidos sob o slogan “seguro, legal, mas raro”, e foi a sua quebra que hoje reacendeu o debate mundo afora e ameaça a legalização. Isso porque, após conquistado, os defensores do aborto abandonaram o argumento do início da vida e lutaram pelo fim das restrições. O slogan mudou para “seguro e legal”, visto apenas como uma questão de saúde pública e de liberação feminina.

Vimos isso recentemente na Colômbia, onde foi aprovado o aborto até seis meses de gestação, mas o exemplo mais gritante foi na Virgínia, em 2019, quando tentou-se permitir o aborto sem restrição de tempo. Quando perguntado se uma lei sem restrição permitiria o aborto até de um bebê prestes a nascer, o governador do estado americano deu a seguinte declaração:

“Neste exemplo em particular, se uma mãe estiver em trabalho de parto, eu posso te dizer exatamente o que iria acontecer: O bebê seria parido. O bebê seria mantido confortável. O bebê poderia ser ressuscitado se a mãe assim desejasse, e então uma discussão sobre isso aconteceria entre os médicos e a mãe”.

O escândalo dessa declaração reascendeu nos Estados Unidos a força dos movimentos pró-vida, restringindo o aborto em diversos estados. Alguns como a Flórida voltaram para até o primeiro trimestre, enquanto outros, como o Texas, agora o permitem apenas até o primeiro batimento do coração (entre a 3ª e a 10ª semana).

É importante notar que essas medidas não foram reacionárias, mas sim conservadoras. A indignação ao ver um governador defender abertamente a morte de um recém-nascido escancarou que o consenso pragmático instituído para legalizar o aborto foi rompido, e, qualquer limite concedido pelo movimento pró-vida seria visto apenas como um obstáculo a ser derrubado pelo movimento pró-aborto. Se mesmo assim a população pró-vida deixasse seu ceticismo de lado e permitisse isso continuar (ainda mais quando leis de aborto irrestrito surgiam em outros estados como Nova Jersey), elas não seriam conservadoras, mas sim progressistas.

Discutindo com respeito, e não com desdém

Talvez você leitor tenha lido tudo isso e permanecido a favor do aborto, e por mim tudo bem. Afinal essa é uma das questões atuais mais complexas, e é verdade que só proibir algo por lei não encerra o problema. Dito isso, acho importante levarmos o que foi apresentado em conta para podermos falar um com o outro ao invés de um por cima do outro.

O aborto para as pessoas pró-vida não é como a maconha, onde a decisão e consequência afetam apenas ao indivíduo, mas sim como o assassinato, onde a decisão pode levar ao fim de outra vida. E é claro que nenhum dos dois deixará de existir ao ser proibido, mas o assassinato é proibido mesmo assim porque entendemos como sociedade a importância de proteger a vida humana. E claro que há exceções: o aborto já é consenso para casos como o estupro, o perigo à vida da mãe, e a anencefalia. Mas quanto ao resto?

Foi argumentado de modo bem enfático de que os “frutos de uma noitada gostosa regada a entorpecentes” precisam ser abortados pelo bem da saúde e segurança públicas. E apontado (corretamente) que nem todos os pais conseguem dar a presença e o cuidado necessários para o crescimento de uma criança, argumentando também ser bizarro punir os pais exigindo que eles arquem com as consequências de seus atos. Além disso, foram detalhadas as péssimas condições de vida pelos quais uma criança possa passar para argumentar que abortar uma criança é amá-la ao ponto de desejar que ela não tenha nascido.

Do meu ponto de vista, esses argumentos são uma perigosa relativização da vida humana feita por conveniência. Um bebê realmente não é uma punição aos pais. Ele é um indivíduo como todos nós, e deve ser cuidado porque é um indivíduo com direitos. A vida dos pais realmente seria mais conveniente se essa criança não tivesse existido, mas ela existe. E não cabe a nós decidirmos que o destino dessas crianças é uma vida de miséria quando foram elas as pessoas que criaram nosso mundo e posição política. Não acredita? Vem comigo.

Capitalismo: O sistema dos indesejados

Antes da revolução industrial, todos os empregos na Inglaterra já estavam reservados. Esse era o sistema de guildas, onde não havia espaço para novos participantes. Eis que houve um boom populacional tão grande que mais da metade da população inglesa não tinha como arranjar emprego. Eram adultos e crianças jogados na rua sob condições ainda mais terríveis do que vivemos hoje no Brasil e, como ninguém se importava com eles, eles decidiram produzir para si mesmos. Esse foi, segundo Mises, o início da produção em massa, da Revolução Industrial e do capitalismo, que nunca teria acontecido se os pais dos futuros grandes industriais ingleses tivessem decidido abortar para salvá-los da dura realidade do mundo.

Claro… não seremos ingênuos de que essas crianças não vão sofrer muito por serem quem são. Elas vão e muito. Mesmo assim, interromper a vida delas e tirá-las a chance de tentar vai contra o dever geracional, uma das bases do conservadorismo propostas por Edmund Burke: conservadores acreditam ser responsabilidade da geração atual construir as estruturas da sociedade que a geração seguinte viverá. Faz muito mais sentido sob esta lógica, ao invés de gastar milhões em clínicas de aborto, investir esses milhões em clínicas de apoio às mães e em centros sociais e pedagógicos para os filhos, construindo as estruturas que permitam a essas mães terem seus filhos. É difícil? Muito! Mas o aborto age de maneira anti conservadora quando mata as futuras gerações para a conveniência da geração atual.

Um ponto de vista a se respeitar

Agradeço imensamente a você que leu até aqui. Fico feliz caso eu tenha conseguido te convencer do lado pró vida e, caso não tenha conseguido, espero pelo menos ter lhe mostrado que essa não é a posição de reacionários ignorantes, e sim uma posição válida e coerente tanto para conservadores quanto para qualquer outra ideologia. Por isso ela precisa ser tratada com o devido respeito para conseguirmos ter uma discussão social legítima sobre o tema.

As pessoas pró-vida não são contra o aborto porque ignoram a dor das mulheres que morrem a cada dois dias por um aborto inseguro sem nem sabermos seus nomes. Somos pró vida porque, bem-sucedido ou não, um aborto mata despedaçado um bebê que não viveu nem tempo suficiente para ter um nome. Reconhecemos a dor desse ser que teve uma morte lenta e extremamente dolorosa, mas cujos desesperados gritos de dor nunca serão ouvidos.


Paulo Grego

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