Quem tem Medo da Solidão?

Quem tem Medo da Solidão?

Essa é uma palavra assustadora – “sozinho”. As leis dizem que ninguém entre os homens pode estar sozinho, nunca e nenhuma vez, porque essa é a maior transgressão que pode haver e a raiz de todo mal. Mas violamos muitas leis. E agora não há nada exceto nosso corpo; é estranho ver apenas duas pernas esticadas no chão e na parede diante de nós apenas a sombra de nossa própria cabeça. – Ayn Rand em O Cântico.1

Apesar de o trecho acima pertencer a uma obra publicada em 1938 a solidão, tão assustadora para o personagem, é temida por milhões de pessoas até os dias de hoje. Não ouso tentar explicar o porquê, pois tenho certeza de que não esquadrinharei a questão suficientemente, nem serei capaz de explicar todos os seus aspectos, mas me atrevo a dizer que há duas hipóteses que venho percebendo em muitas das pessoas que compartilham deste medo, ou desta aversão à solidão:

1 – Muita gente não sabe que há uma diferença entre solidão e solitude;

2 – Estar sozinho(a) significa que você precisará conviver e lidar consigo mesmo(a), e para alguns, isso é absolutamente aterrorizante.

No que diz respeito ao primeiro ponto, não razão para se sentir mal por não saber esta diferença, se você procurar o significado da palavra solidão em algum dicionário online, verá que ambos os conceitos estão representados numa só palavra, sem qualquer diferenciação:

“Estado de quem está só, retirado do mundo ou de quem se sente desta forma mesmo estando rodeado por outras pessoas; isolamento: os encantos e as tristezas da solidão”.2

O tema é de tamanha relevância, que há mais de um site dedicando uma artigo ou matéria a explicar a diferente para a população no geral, contanto até mesmo com especialistas para tratar do assunto.

Em breve resumo, solidão é sentir-se só, quer você esteja realmente desacompanhado(a), ou em meio a uma multidão, já a solitude é estar só, por escolha, sem tristeza, dor, abandono, nem nenhum outro sentimento ruim.

Vamos fazer uma pausa para que eu deixe bem claro que não estou fazendo um texto para propagar o isolamento, de forma alguma, mas quero que vocês, os leitores, possam refletir sobre a importância de ter equilíbrio ao ponto de aproveitar tanto a companhia quanto a solitude, de forma saudável. Quero questionar esse medo de estar só para que você busque as causas dele em sua vida.

Em outro trecho de O Cântico, lemos:

Na parte superior dos portais do Palácio do Conselho Mundial, algumas palavras estão gravadas no mármore, que repetimos para nós mesmos sempre que nos encontramos tentados: “Somos um por todos e todos por um Não há homens exceto o grandioso NÓS, Uno, indivisível e eterno”. – Ayn Rand em O Cântico

Não estamos vivendo a distopia narrada no livro, mas estre trecho é revelador. Talvez tenhamos medo de nós mesmos, talvez a questão seja a nossa insegurança, não é fácil assumir os riscos de ser você mesmo, de ter uma identidade e se não se dobrar aos caprichos da multidão. A gente sempre pensa: “todos estão indo, porque eu ficaria sozinho?” ou “Poxa, mas está todo mundo dizendo a mesma coisa!”. Será possível que tenhamos tamanha dificuldade em pensar: “Dane-se que todos estejam indo, eu quero ficar e não há nenhuma ilegalidade ou mal nisso” ou “não é impossível que todos estejam errados”.

Ao perceber que sua invenção seria rechaçada e que receberia castigo inimaginavelmente pesado por, pensar, criar e ousar desafiar a maneira estática como as coisas sempre foram e deveriam continuar sendo, Igualdade 7-2521 foge, levando consigo sua preciosa criação. Neste ponto, mais um trecho me chama muito a atenção:

Acordamos quando um raio de sol cruzou tocou rosto. Quisemos levantar rapidamente, como levantamos por todas as manhãs de nossa vida, mas rapidamente nos lembramos de que nenhuma campainha havia soado e não havia nenhuma campainha para soar. Permanecemos deitados, abrimos nossos braços de forma displicente e olhamos para o céu. As folhas acima de nós eram onduladas, tinham as bordas prateadas e tremiam como um rio esverdeado e flamejante fluindo diante de nós.

Não pretendíamos nos mexer. Pensamos que poderíamos ficar daquele jeito o quanto quiséssemos e rimos alto por esse pensamento. Também podíamos nos levantar, correr, saltar e deitar novamente. Concluímos que tais pensamentos não faziam sentido, mas antes de chegarmos a essa conclusão nosso corpo se levantou num único salto. – Ayn Rand em O Cântico

A jornada do personagem o fez entender que a solitude não é um pecado, que é possível e saudável aproveitar momentos consigo mesmo, fazer algo com o único proposito de relaxar, se divertir ou descobrir algo novo. Parece óbvio, mas existe muita gente precisando redescobrir esta verdade, ainda que a nossa realidade seja diferente daquela narrada na história.

É necessário que você entenda que desistir de sua identidade nunca vai te fazer feliz, pelo contrário, aumentará a sua solidão. Tornar-se um alguém sem voz, sem timbre próprio, sem rosto, sem opiniões, sem a beleza de aprender algo novo, de mudar seu ponto de vista, de ouvir o argumento dissidente te faz sentir-se só porque você está tentando o impossível: afastar-se de si mesmo(a), e esta é uma batalha perdida que te machucará profundamente.

Você só vai conseguir contemplar a beleza da companhia de alguém quando aprender a aproveitar a sua própria companhia de vez em quando. Só vai conseguir se conectar com as pessoas, quando tiver uma conexão consigo mesmo(a), quando souber quem você é, poderá decidir quem fica e quem sai da sua vida e o porquê.

Eis o ponto interessante da jornada de Igualdade 7-2521, agora na companhia de Excelente (a quem ele deu um nome, ainda que fosse contra as leis da época), ele chegou em um ponto importantíssimo em sua jornada de aprendizado:

Tudo que é oriundo de muitos é bom. Tudo que é oriundo de um só é mau. Assim fomos ensinados desde nosso primeiro suspiro. Violamos a lei, mas nunca duvidamos dela. Porém agora, enquanto andamos pela floresta, aprendemos a duvidar. – Ayn Rand em O Cântico.

Não acho saudável que as pessoas tenham tanta dificuldade em passar algumas horas em solitude, lendo, ouvindo música, contemplando ou não fazendo absolutamente nada. Também não acho saudável que não saibamos aproveitar bem as boas companhias.

Apesar de trazer alguns esclarecimentos, este texto não é para trazer respostas, muito pelo contrário, quero te provocar a fazer perguntas. Quero que as pessoas aprendam a duvidar e discernir, a entender quando precisam de ajuda e quando têm que resolver o problema sozinho(a). Eu quero que você descubra quem é, o que gostaria de ser, onde deseja mudar, melhorar ou permanecer como está.

Aproveite a boa companhia, mas não tenha medo da solitude, este equilíbrio te ajudará a aproveitar mais e melhor a vida.


Suellen Marjorry

*As opiniões do autor não representam a posição do Damas de Ferro enquanto instituição.


Notas de Rodapé

  1. RAND, Ayn. Cântico. 1.ed. São Paulo: Vide, 2015 ↩︎
  2. Disponível em: https://www.dicio.com.br/solidao/ ↩︎

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