Estados Unidos e as Eleições Presidenciais de 2024: um panorama das principais questões na corrida para a Casa Branca. 

Estados Unidos e as Eleições Presidenciais de 2024: um panorama das principais questões na corrida para a Casa Branca

Se alguém me perguntasse – antes do terrível acontecimento do dia 13 de Julho e do anúncio de Joe Biden de que não concorrerá mais à reeleição – o que eu achava da corrida presidencial americana, minha resposta seria: parece um remake que não logrou fazer jus ao filme original. Comentando o primeiro debate presidencial com um amigo eu cheguei a dizer: a voz do Joe Biden está tão baixa, sem energia, como se falar fosse um esforço colossal, a verdade é que o microfone do presidente precisa de um microfone. 

A tentativa de assassinato do ex-presidente mudou o tom da discussão, pelo menos para mim, é impossível não refletir quando um jovem de 20 anos de idade acerta, de raspão, a orelha de Trump. Trata-se de um ato de violência inaceitável em qualquer lugar do mundo, e incompatível com os valores da liberdade e da democracia, mas escancara a profunda e triste realidade de um país terrivelmente dividido. 

A América já estava polarizada, mesmo que muitos não tenham tido a coragem de admitir, deste muito antes de 2016, no entanto, candidatura e os 4 anos de mandato do 45º Presidente aprofundaram a questão e adicionaram uma alta carga emocional às discussões. Em muitos casos, não se trata mais de discordar do outro, mas de odiar quem não acredita na mesma cartilha que você. 

A questão é que não há nenhuma justificativa para o atentado contra o ex-presidente e, ao meu ver, tais atos repudiáveis devem ser condenados com veemência. Nenhuma divisão política nem discordância de qualquer natureza deveria levar um jovem a cometer tal atrocidade. 

A Convenção Nacional do Partido Republicano 

Trump respondeu como o esperado, mostrando força e deixando claro que não mudaria sua agenda por causa do acontecido, assim, entre 15 e 18 de Julho, a Convenção Nacional do Partido Republicano ocorreu como planejado. Alguns membros da família de Trump se fizeram presentes, discursando em favor do ex-presidente e, dentre muitos outros oradores, me sinto obrigada a citar dois: Tucker Carlson e Hulk Hogan. 

Desculpe a minha sinceridade, mas ver o nome do jornalista que foi convidado para ir à Rússia e fez vídeos dignos do prêmio de maior vergonha alheia da história, como seu passeio por um supermercado em Moscou (refiro-me a Turcker Carlson – veja o vídeo em inglês aqui), e o ex-lutador de Wrestling que levou os conservadores à loucura rasgando a camisa (Hulk Hogan), são tudo o que você precisa saber sobre o estado atual do Partido Republicano. 

Figura 1 – Fonte: https://www.npr.org/2024/07/18/g-s1-11894/hulk-hogan-rnc

A Saúde, a Idade e a desistência tardia de Joe Biden em concorrer à reeleição.

Diagnosticado com Covid-19, o atual presidente vinha sofrendo pressão de doadores do partido Democrata, celebridades apoiadoras, da mídia e de comentaristas políticos para desistir da candidatura em prol de um nome capaz de enfrentar Trump. 

As gafes de Biden e suas confusões se tornaram cada vez mais frequentes e preocupavam os eleitores, não somente por não acreditarem que ele poderia vencer Trump, mas por não acreditarem que ele conseguiria concluir seu mandato, se eleito. 

Durante o final de semana a imprensa noticiava que o total de Congressistas do Partido Democrata que pediam que Biden desistisse da campanha era 34, sendo 12 destes nas últimas 24 horas, ou seja, após o anúncio de que Biden havia sido diagnosticado com COVID-19. Além disso, reportava-se que nomes como a ex-presidente da Câmara, Nancy Pelosi, atuavam nos bastidores em favor de uma desistência.

É impossível não comparar esta situação com a de Ronald Reagan à época de sua reeleição, em Outubro de 1984, aos 73 anos de idade, ele era o candidato mais velho a concorrer a uma eleição presidencial em toda a história. No segundo debate presidencial foi confrontado com sua performance no debate anterior, seus momentos de lapso e o suposto cansaço após o final, será que ele conseguiria exercer o cargo? O 40º Presidente encerrou a questão de maneira impressionante e inteligente ao responder ao questionamento do jornalista Henry Trewhitt afirmando: 

“[..] Eu gostaria que você soubesse, também, que eu não farei da idade um assunto desta campanha. Eu não vou explorar, para fins políticos, a juventude e inexperiência do meu oponente”. (Veja o vídeo aqui

O oponente de Reagan, Walter Mondale, tinha 56 anos de idade à época, e a resposta do Presidente arrancou risadas de todos, incluindo o adversário. 

Não estou dizendo que Biden devia ter feito uma piada com a questão, esta era uma característica de Ronald Regan, ou seja, pequenos comentários (one liners – como são chamadas em inglês) que faziam as pessoas rirem, e que caiu muito bem neste momento, mas já era uma estratégia usada em diversas outras ocasiões. Além disso, a situação dos dois se diferencia já que, ao contrário do atual presidente, Reagan tinha o apoio e a confiança do Partido Republicano e de seus apoiadores. O que quero apontar é que trata-se de uma questão que merecia ser devidamente respondida, e não simplesmente reafirmar que estava tudo bem e que iria continuar na disputa. 

Tudo o que vemos é um presidente que ora custa a falar, como no primeiro debate, ora fala com certa energia, como em seu discurso após o primeiro debate. No meio destas duas ocasiões existem lapsos de memória e algumas confusões mentais preocupantes. 

Não lidar com a questão não a fez desaparecer, mas passou uma mensagem de que a campanha estava tentando fugir de algo com o que não conseguia lidar. 

A decisão de desistência da campanha, anunciada no domingo, 21 de Julho, fez com que Trump tivesse tempo para ser visto e ouvido, causou divisão no Partido Democrata (entre os que apoiavam Biden e os que não o queriam como candidato a presidente) e fez com que o(a) novo(a) candidato(a) perdesse precioso tempo de campanha.

Esta decisão era esperada desde que, segundo informado por uma fonte anônima, neste fim de semana Biden perguntou a assessores se Kamala Harris poderia vencer Trump nas eleições. 

Por mais que alguns tenham enorme dificuldade em admitir, a verdade é que desde 2020 a imprensa pedia a Biden, quem já dava sinais de fraqueza, que simplesmente continuasse vivo. Além disso, em pesquisa realizada em 2022, 75% dos eleitores democratas disseram que não queriam que o atual presidente fosse o candidato do Partido nestas eleições.

A letargia em agir, seja respondendo de forma contundente ou desistindo da campanha, tomou tempo precioso para escolher alguém melhor, com cuidado, e por meio do procedimento correto, as primárias do Partido Democrata. 

Eu sei que Joe Biden não queria ser um “presidente de um mandato só”, mas há uma longa e tortuosa estrada entre candidatar-se e ser reeleito, caminho este que, evidentemente, ele não conseguiria percorrer.

Biden sai com uma imagem pior do que esperava e perde até mesmo um pouco do prestígio que poderia dar a um outro candidato que deveria ter sido eleito nas primárias. Tudo isso por sua teimosia em não escolher o que era, com toda certeza, a única decisão certa a ser tomada: dar lugar a uma nova liderança preparada e capaz de competir nas eleições.

O Presidente e sua campanha precisavam ter entendido bem mais cedo que este cenário de incertezas, regado a pedidos de desistência e muita especulação da imprensa, só favorece a Trump.

Voltando ao caso de Ronald Reagan, em Novembro de 1984, o então presidente foi reeleito vencendo em 49 dos 50 estados americanos, tendo perdido apenas em Minnesota, estado natal de seu adversário. O primeiro debate, que deu a Mondale a esperança de haver uma chance de vencer, foi um curto respiro já que, no segundo, “o grande comunicador” voltou com 100% da sua excelente retórica. 

Joseph R. Biden não é, nem de longe, Ronald Wilson Reagan. Não só por terem pensamentos políticos diferentes, mas porque Reagan tinha, aos 73 anos, o charme, o carisma, a rapidez de raciocínio, a inteligência e a capacidade comunicativa que poucos conseguem durante toda uma vida. 

Conclusão

As principais questões dos últimos dias, o terrível atentado contra Trump, a convenção dos Republicanos, a contínua pergunta em torno da saúde e da idade de Biden e sua desistência tardia revelam, ao menos para mim, um cenário desanimador. Não há sinal de novas lideranças emergindo porque aqueles que chegaram ao poder não conseguem admitir que seu tempo chegou ao fim. 

Ao menos os eleitores independentes não vão mais ter que escolher entre um homem instável, cujas redes sociais criam sérias questões diplomáticas, e um presidente confuso, com lapsos de memória preocupantes. 

Esta enorme dificuldade em ver que seu tempo chegou ao fim, a mania de não treinar os novos líderes por medo de perder sua posição, ao invés de entender o processo da sucessão e da transformação, causa diversos problemas na política americana atual. 

A eleição deste ano tem me feito enfrentar a dura realidade de que a política americana que eu sempre acompanhei não existe mais, nem sei se jamais voltará a existir, estamos vendo a era de discussões absurdas, teorias da conspiração e atentados repugnantes. 

Morreram os debates inteligentes e são escassas as falas coerentes e inteligíveis, mas por quê? Porque não há lideranças novas, mas uma sucessão de revanches entre as mesmas pessoas; porque os líderes atuais estão mais preocupados em manter o poder que em fazer seu trabalho; porque, pelo menos no caso dos Republicanos, os poucos novos integrantes da política ganharam seus lugares ao sol vendendo seus princípios, identidade e pensamentos próprios em prol da narrativa do líder atual.  

Em Novembro de 2022 haviam 35 vagas – de um total de 100 cadeiras –  para o Senado e 435 na Câmara  em disputa nas eleições Americanas, apenas 84 novos representantes foram eleitos, 7 Senadores e 77 Congressistas (equivalente a Deputados Federais). 1

Agora o problema é mais profundo e mais difícil de se resolver, não basta apenas eleger novos nomes, mas os nomes certos, para tentar reduzir a imensa divisão e diminuir os absurdos e teorias da conspiração. Mas, na verdade, muitos eleitores não tem este objetivo, eles querem mais Matt Gaetz e Marjorie Taylor Greene. 


Suellen Marjorry

*As opiniões do autor não representam a posição do Damas de Ferro enquanto instituição.


Notas de Rodapé

  1.  Fonte: https://ballotpedia.org/Election_results,_2022:_New_members_elected_to_Congress ↩︎

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *