Considerações sobre a criação do CIEDDE.
Você já sabe que o Tribunal Superior Eleitoral – TSE criou o Centro Integrado de Enfrentamento à Desinformação e Defesa da Democracia, e que seu objetivo será atuar no combate às Fake News, discursos de ódio, discriminatórios ou anti-democráticos e condutas abusivas. Trata-se de um órgão que aproxima a justiça eleitoral das redes sociais, assim como uma rede de monitoramento do recém-criado órgão e tribunais regionais eleitorais.
As eleições de 2024 revelaram novas regras, bem como uma vontade cada vez maior de combater as Fake News ou, como muitos concordam, de controlar o que é verdade e o que pode ou não ser veiculado como opinião. Regras que nem mesmo o Congresso Nacional foi capaz de levar à votação estavam sendo discutidas pelos ministros. Segundo o atual presidente do TSE, Ministro Alexandre de Moraes:
“O TSE tem a missão de garantir a liberdade na hora da escolha do eleitor. Essa vontade vem sendo atacada de forma virtual por milícias digitais, que, se aproveitando de notícias fraudulentas, pretendem capturar a vontade do eleitor na hora de seu voto. É necessário que a Justiça Eleitoral possa estar preparada para combater a desinformação”.1
Permissa Vênia, Excelência! A liberdade é uma causa nobre e um direito fundamental da pessoa humana pelo qual todos devemos lutar, no entanto, este nobre objetivo não pode ser atingido por meio do silêncio, ou de uma aparente tentativa de deter o poder de definir o que é verdade.
“Se a liberdade significa alguma coisa, será, sobretudo, o direito de dizer às outras pessoas o que elas não querem ouvir.” –
George Orwell
Eu queria poder dizer a vocês, caros leitores, exatamente como esta tripla cooperação funcionará, mas devo admitir que ainda não é evidente para mim. O mesmo pode ser dito a respeito da criação deste órgão, o que ele fará que não poderia ser feito pelo próprio TSE? O que justifica mais um órgão público? Quais os custos disso? Quais os critérios para definir o que é verdade e o que é desinformação? Quem são os funcionários deste órgão? Sabemos que será comandado pelo Presidente do TSE, mas, até o momento, é minha única certeza.
São muitas dúvidas advindas de uma decisão que, para muitos, carrega incertezas e que traz à mente pensamentos incômodos sobre toda esta situação. Não seria muito poder concentrado? Talvez seja a minha mania de sempre lembrar que o caminho para o inferno está pavimentado de boas intenções, mas talvez seja o enorme oceano de dúvidas ao redor desta decisão que me causam tanta estranheza.
Com a cooperação do Ministério da Justiça, Procuradoria-Geral da República, Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e da Anatel, o novo órgão já nasce com uma força e poder de ação enormes. Ainda que a promessa seja atuação durante as eleições, com tantas incertezas, eu não sei se este espaço de tempo será respeitado, nem sei se há maneiras de sabermos caso não seja.
A questão a ser colocada com bastante ênfase nesta determinação é: Qual é o histórico, no Brasil, que permita a confiança na atuação deste órgão com tantos poderes? Não é com leviandade que a repercussão da criação do CIEDDE está tomando dimensões grandiosas, afinal, nenhum de nós compreende exatamente a forma com que é pretendido alcançar o objetivo de combater o discurso de ódio e proteger a democracia.
Em seu livro “Hate: Why We Should Resist It with Free Speech, Not Censorship”, Nadine Strossen analisou mais de 50 anos de experiências de tentativas de podar a liberdade civil em nome de uma suposta defesa da democracia e combate contra o discurso de ódio. O resultado de sua pesquisa não foi satisfatório para aqueles que clamam por mais dispositivos legais e censórios, na verdade, foi contraproducente:
“A falta de correlação entre as leis do “discurso do ódio” e a redução da discriminação ou violência não é surpreendente à luz de várias características de tais leis, que as tornam ineficazes na redução do discurso do ódio e, portanto, na redução dos danos que tal discurso é temido causar”
Nadine Strossen
Além do péssimo histórico de experiências semelhantes no mundo inteiro, existe uma questão ainda mais aterrorizante para nós: é inevitável não reconhecer a semelhança estética e teórica no ministério da verdade, presente na obra “1984”, de George Orwell. Ao menos é uma observação que alguns poderiam vir a fazer, não é o nosso caso, mas trata-se de uma possibilidade a ser considerada.
Levando em conta todas as dúvidas, bem como o histórico de decisões similares ao redor do mundo, não há outra maneira de encerrar este humilde desabafo a não ser com uma afirmação de Nadine Strossen que é assustadoramente correta:
“Se permitíssemos que o governo suprimisse o discurso que pudesse exercer uma influência negativa sobre nossas mentes ou ações, nenhum discurso estaria seguro”.
Autor: Eleitor(a) Pagador(a) de Impostos
Notas de Rodapé